terça-feira, 24 de maio de 2011

Um roteiro de hotéis conscientes

17 de maio de 2011
 
 
 
Área reflorestada da pousada Toca da Coruja, em Natal: compostagem, energia solar e trabalho com a comunidade / Foto de divulgação
 
Aquela velha ideia de que turismo sustentável era sinônimo de viajar para o meio do mato, sem estrutura e com muito perrengue, foi aposentada. Hoje em dia, ter apenas uma roupagem de natureba não garante a pousada alguma o título de ecofriendly. O que importa é oferecer mais, causando menos impacto. Esse é o lema da associação Roteiros de Charme, criada logo após a ECO-92, com base nos princípios socioambientais da conferência. De 19 hotéis brasileiros apontados na última lista da revista National Geographic Traveler, uma das mais respeitadas publicações de turismo ambiental no mundo, oito são da instituição, que apoia empreendedores da área a fazerem uma transição da hospedagem convencional para o conceito de turismo consciente.
Tudo começou com a constatação de que as viagens são um dos grandes problemas em relação à sustentabilidade atualmente. Se os impactos de pousada e hotéis não forem pensados, podem ser mortais para algumas regiões. Isso porque o impacto vai muito além do empreendimento em si. São mais pessoas atraídas para o local, mais esgoto, mais lixo, mais transportes, e muitos outros mais. E nem sempre o destino comporta essas novidades.
Foi pensando nesse passivo gerado e no mercado que se abria para o turismo consciente que o presidente da Roteiros de Charme, Helenio Waddington, resolveu colocar debaixo do braço a Agenda 21 - documento com compromissos socioambientais de empresas, governos e associações, divulgada após a ECO-92 - e dela extrair um código de conduta para a então recém criada associação. Waddington, que é dono da pousada Rosa dos Ventos, em Teresópolis, e até hoje é presidente da Roteiros de Charme, elaborou regras e sugestões de boas práticas socioambientais para o setor, que até hoje não possui um código de conduta mundial:
- Naquela época, não existia turismo sustentável. Ninguém sabia como podia ser isso. Nem eu. Por isso, busquei apoios, como a Agência Ambiental das Nações Unidas (a Unep) - explicou Waddington. - Dez anos atrás, ouvi num seminário, do diretor de qualidade da Maison Hermés, que luxo não é mármore Carrara, mas é espaço, ar puro e água limpa. Achei genial. A associação não tem apenas hotéis luxuosos. Temos empreendimentos de vários tipos. O que importa é que eles sejam adequados à realidade local.
Na prática, significa que não faz sentido um mega resort no Pantanal, por exemplo, já que o lençol freático aflora. Como também não faz sentido um hotel com arquitetura modernosa no meio de uma cidade que é patrimônio cultural do país.
Entre as práticas que fazem parte do código de conduta da Roteiros de Charme estão o tratamento de esgoto, a preservação de áreas de alta biodiversidade ou valor cultural, reutilização, redução e reciclagem de materiais, controle de poluição e redução da incineração do lixo, de queimadas e desmatamento, entre outros. Segundo Waddington, uma pesquisa feita recentemente com hotéis da rede constatou que 70% já usam energia solar para aquecimento de água, 35% têm hortas orgânicas e todos possuem reuso de água e reciclagem de resíduos, em diferentes graus. Ainda de acordo com o presidente, há também pelo menos 50 projetos socioambientais apoiados por hotéis-membros:
- Para manter uma pousada funcionando, é necessário manter o destino turístico bem cuidado. O retorno dos investimentos é muito claro no setor. Há resorts muitos grandes, por exemplo, eliminando esgoto diariamente em praias lindas brasileiras. Muitos não cumprem nem as exigências mínimas ambientais. Em breve, as cidades onde eles estão deixarão de ser tão atraentes, e não gerarão lucro. Ainda vão prejudicar o meio ambiente e toda a população. Nenhum hotel é 100% sustentável ainda, mas há aqueles que estão no caminho.
É bom lembrar aos viajantes que sempre há impactos para a construção e para o funcionamento desses empreendimentos. Além disso, o fato de um hotel ou pousada fazer parte da associação não significa que a empresa segue toda a cartilha socioambiental da Roteiros de Charme. Há hotéis mais avançados, e outros ainda em fase de implantação ou adequação de projetos. De qualquer forma, hospedar-se em hotéis mais >ita<ecofriendly não significa poupar o meio ambiente. Na prática, é uma mudança que leva tempo e nem todas as soluções sustentáveis estão disponíveis a um preço acessível. Mas o turista já pode incluir na lista de perguntas a serem feitas antes de efetuar a reserva, algumas dúvidas sobre sustentabilidade (ver box ao lado).
Empregar a população do entorno, por exemplo, é um quesito básico para um empreendimento responsável. Outros pontos são tentativas de economia de energia, água e reutilização e reciclagem de resíduos. Tudo isso tem um custo inicial, mas, segundo Luiz Henrique Ribeiro, proprietário da pousada Toca da Coruja, na Praia do Pipa, perto de Natal (RN), vale a pena. A pousada faz parte da Roteiros de Charme há dez anos e estava entre as oito indicadas pela lista National Geographic, divulgada em março deste ano. Tudo graças a melhorias que trazem ganhos não só do ponto de vista socioambiental, como também no componente econômico. Hoje, a pousada faz compostagem que abastece a horta orgânica, reutiliza e recicla o que pode, além de aquecer água com energia solar.
- Já recuperei todos os investimentos que fiz - disse Ribeiro - Reflorestamos a área no entorno da pousada, estamos capacitando mão de obra local e já conseguimos vitórias com a prefeitura, como a chegada de saneamento básico à Praia do Pipa. Tudo isso é revertido em benefícios para o negócio. Quando se instala num lugar, você passa a fazer parte daquela população e das mesmas demandas.
Segundo Ribeiro, que é agrônomo, a Toca da Coruja foi concebida com a ideia de se tornar uma hospedagem ecológica. Mas, antes de receber apoio da associação, faltava experiência de gestão para transformar o conceito de ecologia em práticas. Para se candidatar a uma vaga na Roteiros de Charme, pode-se entrar em contato com os donos por meio do site, mas é preciso já possuir ações de responsabilidade social e na área ambiental em curso.

Um comentário:

  1. A partir do fato acima é possível se constatar que a experiência com o turismo vai além dos impactos que empreendimentos causam ao local, estes envolvem questões como o aumento de pessoas circulando no local, a quantidade de lixo e esgoto produzida entre outros. Outra argumentação passa pela importância da preservação do meio ambiente, para que este continue sendo procurado, sem suas belezas naturais, o lugar perde o valor. Além disso observar as questões do entorno, o empreendimento tem que estabelecer relação com o meio envolvido, não só no âmbito natural, mas também nos seus aspectos formais e sociais.

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